A Primeira aparição nos quadrinhos
Alguém duvida que o mundo é dos nerds? Se duvida, veja – por exemplo – o sucesso do seriado “The Big Bang Theory” e terá uma amostra de como a cultura pop invadiu a mídia seja através da adaptação de jogos (Battleship, Tomb Raider), brinquedos (Transformers, G.I.Joe) ou quadrinhos. Um dos personagens mais populares desse meio é a figura de um jovem aspirante a cientista, que por obra do destino, ganha poderes incríveis e força sobre humana, proporcionais ao seu enorme senso de responsabilidade. Seus atos, contudo, despertam desconfiança e intolerância, inflamadas pelo sensacionalismo da imprensa local. Tudo isso, e mais o fato de que seus poderes vêm de um animal que gera repulsa e fobia, e qualquer chance de sucesso seria muito improvável naquela primeira metade dos anos 60.
Aí vem o Homem-Aranha: Assim nasceu o Homem Aranha (Spider Man), desacreditado pelo editor Martin Goodman que publicou o personagem, imaginado por Stan Lee e Steve Ditko, nas páginas da revista “Amazing Fantasy” #15 (Agosto de 1962), cuja tiragem era insatisfatória e estava marcada para cancelamento iminente. Provando que perdedores conseguem mudar o rumo de suas vidas e se tornar grandes vencedores, o personagem caiu no gosto dos leitores que se identificaram com a história do orfão Peter Parker, criado por seus tios e nada popular entre os colegas de escola. Ao ganhar seus poderes, Peter inicia um processo de amadurecimento, premissa reforçada pela frase criada por Stan Lee e que se tornaria marca registrada do herói “Com Grandes Poderes vem Grandes Responsabilidades”. O sucesso nas vendas daquela última edição de “Amazing Fantasy” convenceu os editores a lançar o personagem em seu título próprio “The Amazing Spider Man” em Março de 1963.
Surge o vilão Elektro
No início da década de 60 o mundo estava mergulhado no clima da guerra fria, conflitos raciais tomavam conta das ruas e os jovens embalavam sua rebeldia ao som do Rock dos Beatles e Stones. A radiação nuclear era a tecnologia do momento e foi o gatilho empregado por Stan Lee para justificar os poderes de Peter Parker, picado por uma aranha contaminada por radiação durante uma experiência no laboratório. Quando o Homem Aranha foi criado por Stan Lee & Steve Ditko, não era comum heróis que fossem adolescentes, a não ser que fossem “sidekicks” ( parceiros de heróis) como o caso de Robin, Bucky, e outros. Poucos eram os adolescentes que entitulavam uma revista como o caso do “Superboy” que retratava as aventuras do Superman quando jovem e o “Shazam” que tinha como identidade secreta o jovem órfão Billy Batson. Contudo, o diferencial nas histórias do Homem Aranha era a carga de dramaticidade , já que a vida particular de Peter Parker era tão relevante para as histórias quanto os vilões que ele combatia. Elektro, que ocupa o subtítulo dessa segunda aventura, só surgiu em Fevereiro de 1964, quando o herói já tinha seu título próprio. O insano Duende Verde seria criado para Julho do mesmo ano e Rhino só mais tarde em 1966.
A Primeira Adaptação : O sucesso que a Marvel Comics estava tendo nos anos 70 na Tv com o seriado do Incrível Hulk (Aquele estrelado por Bill Bixby e Lou Ferrigno) convenceu a empresa a aprovar a adaptação realizada pelas empresas CFP, DGP e Danchuk para exibição na ABC . Assim, em 14 de Setembro de 1977, Nicholas Hammond (Intérprete de Friedrich, uma das crianças da família VonTrapp no clássico “A Noviça Rebelde”) foi, aos 27 anos, o primeiro ator a fazer o papel do alter ego do herói aracnídeo. A produção era muito pobre e não aproveitou praticamente nada do material original: nada de super-vilões (o orçamento não permitia) , os famosos coadjuvantes das HQs (Mary Jane, Harry Osborn, Flash Thompson…) não apareciam exceto por J.Jonah Jameson (o editor do Clarim Diário , jornal para o qual Peter trabalha como free-lance). Até mesmo a bondosa Tia May não é mais que uma mera ponta no filme. Curiosamente, o filme chegou a ser exibido nos cinemas brasileiros e gerou uma série de TV com 13 episódios. Ainda houve em 1978 a compilação dois episódios duplos que também passaram nos cinemas brasileiros : “Homem Aranha Volta a Atacar” (The Deadly Dust) e “Homem Aranha & O Desafio do Dragão” (The Chinese Web).
O Homem Aranha da década de 70 na TV
O Caminho para o sucesso nas telas : A possibilidade de uma adaptação para o cinema em ritmo de superprodução já era alimentada em Hollywood há bastante tempo. Na segunda metade dos anos 90, o nome de James Cameron, o diretor de “O Exterminador do Futuro”, “Titanic” e “Avatar”, chegou a ser ligado ao projeto, mas nada ia para frente. Quando a Fox alcançou sucesso com a adaptação dos X Men em 2000, a realização de um filme do Homem Aranha ganhou impulso renovado. A Marvel Comics (que na época ainda não era propriedade da Disney) negociou os direitos com vários estúdios, fechando negócio finalmente com a Sony. O diretor Sam Raimi, colecionador de HQs, vinha de uma bem sucedida carreira no cinema (dirigiu Darkman e Evil Dead – Uma Noite Alucinante) e na Tv (produziu os seriados de Hercules e Xena) , era fã do personagem e ficou com a cadeira de diretor. O elenco selecionado incluiu Tobey MacGuire (de “Garotos Incriveis”) no papel de Peter Parker para o qual já haviam sido cotados os nomes de Leonardo DiCaprio e Jake Gyllenhall , Kirsten Dunst (atriz de sucessos como “Entrevista com o Vampiro” e “Jumanji”) , e James Franco (ator desconhecido que vinha de pequenos papeis no cinema e TV onde interpretou o ícone James Dean, e que chegou a ser testado para o papel de Peter Parker) e William Dafoe (como o vilão Duende Verde, criado por Stan Lee em Julho de 1964 em “Amazing Spider Man” #14) em papel que antes teve cotado o nome de John Malkovich e Nicolas Cage .Todos os atores vestiram bem suas personas e também são dignos de nota os nomes dos veteranos Cliff Robertson (Tio Ben) e Rosemary Harris (Tia May), além do simpático editor J.Jonah Jameson que ficou assombrosamente idêntico às Hqs na pele de J.K.Simmons.
Nas HQs, a galeria de vilões do Homem Aranha é uma das mais bizarras e diversificadas só rivalizando com os inimigos do Batman (na concorrente Dc Comics). Entre todos os adversários do herói aracnídeo, o pior deles é o empresário Norman Osborn, pai de seu melhor amigo Harry, que descobriu a identidade secreta de Peter Parker e fez de tudo para atormentá-lo, chegando a matar sua então namorada Gwen Stacy, do alto da ponte do Brooklin (Amazing Spider Man #121 de junho de 1973), numa dramática sequência que Sam Raimi transpôs para o desfecho do primeiro filme, trocando Gwen por Mary Jane e sem o trágico desfecho. O filme “Homem Aranha” , lançado no Brasil em 17 de Maio de 2002, foi um enorme sucesso.
Tobey Maguire, para muitos o melhor.
Sam Raimi soube equilibrar com perfeição todos os elementos do meio respeitando os aficcionados do gênero e criando um espetáculo atraente para o público em geral. O diretor conseguiu se superar ainda mais na sequência lançada em julho de 2004. Tendo já estabelecido a origem do herói (com a diferença que a teia orgânica havia sido criada para a reinvenção do personagem em 2001 em um universo paralelo chamado de “Universo Ultimate”), apresentado os coadjuvantes, suas motivações e dilemas, Raimi trouxe um vilão memorável na figura do Dr.Octopus (Alfred Molina, em papel para o qual Robert DeNiro esteve cotado), surgido nos quadrinhos em Julho de 1963, antes mesmo do Duende Verde. O filme já começa em alto estilo com os créditos surgindo em meio a um flashback todo desenhado, como em uma história em quadrinhos, pelo conceituado artista Alex Ross Novamente, Raimi trouxe à luz cenas que parecem decalcadas diretas do gibi como a cena do uniforme jogado na lixeira debaixo de chuva (The Amazing Spider Man #50 de Julho de 1967), e a impressionante luta entre o Aranha e o Dr.Octopus no trem suspenso, que termina com o herói desmascarado em público, literalmente uma sequência típica dos quadrinhos de super-heróis, e que lembrou os leitores de uma luta parecida publicada em “Amazing Spider Man #12” de Maio de 1964. O clímax, alcançado no final do segundo filme, trazia a revelação da identidade secreta do herói para Mary Jane e Harry Osborn plantando as sementes para um terceiro filme, confirmado depois de uma bilheteria milionária.
O Final da Trilogia: Contudo, após o sucesso comercial e artístico alcançado pelos primeiros filmes da franquia, Raimi perdeu o controle criativo para os executivos da Sony. O produtor Avi Arad insistia em usar o vilão Venom, um simbionte alienígenas surgido no arco “Guerras Secretas” de 1984 e extremamente popular entre os leitores, mas que não agradava a Sam Raimi que preferia usar algum dos vilões clássicos como o Abutre e o Lagarto.Este já havia aparecido indiretamente nos filmes 1 e 2 através de seu alter ego, Dr.Curt Connors (Dylan Baker) , apontando a intenção de Raimi de utilizá-lo como vilão de uma nova sequência . O terceiro filme, lançado em Maio de 2007, mostrou um roteiro inflado com 3 vilões : Venom (interpretado por Topher Grace, do seriado That 70’s Show), Homem Areia (Thomas Hayden Church) e o segundo Duende Verde (o vingativo Harry Osborn de James Franco), além de uma história que muda fatos do passado (O Homem Areia se torna o assassino arrependido do tio Ben), introduz novos personagens (Gwen Stacy, Capitão Stacy que pertencem a um período cronológico anterior), mas sem levar a lugar nenhum. O resultado, embora não tenha sido nenhum desastre nas bilheterias, foi um filme de qualidade muito inferior. Apesar das tentativas, Raimi deixou o cargo e com ele Tobey MacGuire (que reclamou muito de dores nas costas resultante das cenas de ação) e Kirsten Dunst também partiram.
O Reboot : Depois de três filmes de sucesso consolidado, a Sony decidiu dar um reboot, tal qual tornou-se comum em vários filmes, e contratou o diretor Marc Webb que trouxe Andrew Garfield (do filme “A Rede Social”) para o papel de Peter Parker, deixou Mary Jane de fora voltando cronologicamente para o período em que Peter namorava a loirinha Gwen Stacy, filha do Capitão de polícia, interpretada por Bryce Dallas Howard no terceiro filme de Sam Raimi e agora por Emma Stone . No lugar de Cliff Robertson e Rosemary Harris, entram Martin Sheen e Sally Fields (alguém lembra da Irmã Bertrille do seriado “A Noviça Voadora” ) nos papéis de Tio Ben e Tia May. A decisão prematura de mostrar a origem do herói de novo foi contornada com o acréscimo da figura dos pais de Peter Parker, pouco explorado nas HQs do personagem, e que na história original (publicada em Amazing Spider Man Annual #5 de 1968) foram retratados como espiões a serviço da Inteligência Americana, mortos em missão durante o período da Guerra Fria. O filme foi bem sucedido mas dividiu opiniões tanto dos fâs quanto dos críticos.
Peter & Gwen
O vilão da vez ficou sendo o Dr.Curt Connors (Rhys Ifans) que perdeu um braço e desenvolve um soro desenvolvido a partir da habilidade regenerativa dos répteis. O novo braço surgido traz como efeito colateral a transformação do pobre cientista em uma criatura reptiliana e feroz conhecida como o lagarto (surgido em Amazing Spider Man #6 de Novembro de 1963). O roteiro, no entanto, muda elementos da origem do herói que Raimi respeitou: A picada da aranha modificada geneticamente (nas HQs, aranha radiativa) foi um acidente e no filme de Webb, não. A morte de Tio Ben (Martin Sheen) se dá de forma diferente, depois de uma discussão com o sobrinho e sem a participação de Peter em uma luta livre para ganhar dinheiro. Essas modificações visam transformar o novo filme num produto mais personalisado, distante da trilogia de Raimi, mas em compensação, também distante – ao menos em alguns aspectos – do material de Stan Lee & Steve Dikto. Mesmo assim, dificilmente o filme de Webb será um desastre de bilheteria dada a enorme popularidade do herói aracnídeo e o apelo do personagem junto à plateia jovem em geral. Daí, a escolha de Andrew Garfield, um Peter Parker mais jovem que MacGuire. O caminho para novas sequências certamente foi aberto pois não resta dúvida que aí vem o amigo da vizinhança. Cuidado bandidos, aí vem o Homem Aranha !!