Nada mais justo que encerrar essa série de artigos sobre o Halloween, falando dos próprios seres que batizam a data. No imaginário popular, as bruxas são retratadas como mulheres velhas, narigudas, que voam em vassouras vestidas de preto e com um chapéu pontiagudo. Sua existência já foi contada em livros e filmes das mais variadas formas, ora como as vilãs ou até mesmo no papel de heroínas.
Em tempos medievais, a tradição oral fez notória a história de João e Maria (Hansel & Gretel) nas florestas germânicas fala de uma bruxa que os aprisiona e os alimenta com intenção de devorá-los. Os Irmãos Grimm escreveram a versão escrita que veio a ser publicada no início do século XIX. Em 1937, o escritor Monteiro Lobato incluiu a história no livro de contos “Histórias de Tia Anastácia”. O próprio autor paulistano deixou sua imaginação fluir e criou a Cuca, uma feiticeira em um corpo de Jacaré que se tornou a vilã nas histórias do “Sitio do Pica-pau Amarelo” escritas entre 1920 e 1947. Também da era medieval, uma das bruxas mais notórias é Morgana, também uma das personagens centrais nas lendas arturianas transpostas da tradição oral para o papel por Sir Thomas Mallory no livro “Le Morte d’Arthur” de 1947, um dos primeiros livros publicados na Inglaterra com o advento da imprensa. Que não fique, no entanto, a impressão de que a era medieval foi o berço desses personagens mágicos. A antiga Grécia já relatava a ação de bruxas junto a grandes eventos como Circe, uma poderosa feiticeira presente na “Odisséia” de Homero. O dramaturgo William Shakespeare as retratou como profetizas na obra clássica “Macbeth”, escrita no século XVII. A história registra um episódio particular ocorrido por volta de 1692 em Salem, Massachussets, o lendário julgamento de bruxas. Movidos pela ignorância e pela superstição os regentes do povoado acusaram mais de 100 mulheres de práticas ligadas à magia negra, incluindo curandeiras e qualquer uma cujo comportamento indicasse algum desvio de comportamento. Vinte pessoas, na maioria mulheres, foram submetidas a torturas até que confessassem e morreram, executadas pelos dirigentes de Salem
Muitos séculos depois, a cultura pop viria a mostrar as bruxas sob um aspecto diametralmente oposto: O seriado “A Feitiçeira” (Bewitched) trazia Elizabeth Montgomery no papel de Samantha Stevens, uma bruxa que abdicara de uma vida de mágica para ser dona de casa, mas seus poderes e a presença de seus familiares tumultuava a paz de de seu marido, o publicitário James Stephens (Dick York). O seriado durou 8 temporadas e a bruxaria serviu como metáfora para um casamento entre classes sociais opostas. Na década de 90, a atriz Melissa Joan Hart interpretou uma bruxa adolescente no seriado “Sabrina, aprendiz de feiticeira” (Sabrina The Teenage Witch), e em seguida veio “Charmed” que trazia bruxas que lutavam contra as forças das trevas tal qual heroínas de histórias em quadrinhos. Na literatura, diversos autores souberem ser inventivos para explorar as possibilidades da magia. O século XX começou com o escritor norte-americano L.Frank Baum, que fez da bruxa vilã de sua fábula em série “O Mágico de OZ” (The Wonderful Wizard of Oz), onde a heroína Dorothy acidentalmente mata a bruxa malvada do leste e desperta a ira de sua irmã, a bruxa malvada do oeste. O teatrólogo americano Arthur Miller escreveu em 1953 “As Bruxas de Salém” (The Crucible) e fez das bruxas metáforas para a paranoia macartista que tomou conta da sociedade americana na década de 50. Em 1979, Marion Zimmer Bradley deu às mulheres do ciclo arturiano o devido destaque nos quatro volumes entitulados “As Brumas de Avalon” (The MIsts of Avalon). Se em outras versões Morgana era uma bruxa ambiciosa e fria, Marion a fez vítima de circunstâncias atenuantes, uma sacerdotisa de um período em que o paganismo chegava a um ponto final. Anne Rice deixou de lado os vampiros para falar de bruxaria em dois livros que se completam formando um painel geração após geração da vida de uma família de feiticeiras em “A Hora da Bruxaria” (The Witching Hour), dividido em dois volumes, ambos publicados em 1990. Digno de nota também é o romance de John Updike “As Bruxas de Eastwick” (The Witches of Eastwick) de 1984 que fez da bruxaria uma alegoria para falar de libertação, sedução e feminismo.
O cinema contou com adaptações dessas obras, mas ainda assim sempre recorre à figura da bruxa como um instrumento do demônio, como na farsa arranjada por Edward Sanchéz e Daniel Myrink que usaram de uma campanha viral na internet, até então sem precedentes, para convencer a todos que existia a tal bruxa nas florestas de Maryland, praticamente um fake-lore, um folclore forjado para entreter o suposto documentário filmado por três estudantes. No período clássico bom lembrar de Kim Novak em “Sortilégios de Amor” (Bell, book na candle) no qual interpreta uma sedutora feiticeira que usa de porções e feitiços para conquistar o coração de James Stewart. Sedução também é a maior mágica das irmãs interpretadas por Sandra Bullock e Nicole Kidman em “Da Magia a Seduçao” (Practical Magic) de 2003. A Lista é grande e não podem faltar Michelle Pfeiffer em “Stardust – O Mistério da Estrela” (Stardust), Eva Green em “A Bussola de Ouro” (The Golden Compass) e Bette Midler acompanhada de Sarah Jessica Parker e Katrhy Najimy em “Abracadabra” (Hocis Pocus). A magia não está no caldeirão, mas na imaginação humana. Feliz Halloween!!!